ENTRE RUÍNAS E RECORDAÇÕES: A DESPEDIDA DO EDIFÍCIO SÃO PEDRO


Beatriz Carvalho, advogada e pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Direitos Culturais (GEPDC/PPGD/UNIFOR), autora de monografia sobre o tema, reflete sobre os impactos para a memória coletiva com a demolição do Edifício São Pedro, em Fortaleza – Ceará.

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Erguendo-se majestoso rumo ao céu de Fortaleza, o Edifício São Pedro sempre foi muito mais
do que uma simples estrutura de concreto armado. Destacando-se por sua imponente arquitetura em formato “transatlântico”, o São Pedro representa um símbolo vivo da história e da cultura da cidade, um guardião de memórias que testemunhou silenciosamente décadas de evolução na paisagem urbana. No entanto, o triste desfecho desta história, marcado por sua demolição anunciada em 04 de março de 2024, nos inunda com uma profunda sensação de perda e nos leva a questionar a preservação de nossa herança coletiva.

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A história do Edifício São Pedro remonta a 1951, quando foi concebido como um marco de progresso e modernidade na então efervescente Praia de Iracema. Ao longo dos anos, testemunhou transformações sociais, econômicas e culturais que moldaram a cidade que conhecemos hoje. Seus corredores ecoavam risos, conversas e histórias de gerações passadas, enquanto suas paredes carregavam as marcas do tempo e das experiências vividas por aqueles que por ali passaram.

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No entanto, após o fechamento do Hotel Iracema Plaza na década de 1970, que ocupava suas instalações, o Edifício São Pedro enfrentou um declínio progressivo. O abandono e a negligência corroeram suas estruturas, levando-o à beira do colapso. Apesar do tombamento provisório, em 2006, os esforços para preservar sua história foram tardios e insuficientes, dada a falta de um plano eficaz de conservação por parte dos proprietários e das autoridades competentes.

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A demolição iminente é um golpe duro para a memória coletiva de Fortaleza, um sinal alarmante da fragilidade do compromisso com a preservação do patrimônio cultural. A perda do Edifício São Pedro representa a amputação de mais uma parte da nossa identidade alencarina, caminhando em direção a uma ruptura irreparável com o passado que moldou nossa cidade.

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É lamentável perceber que, apesar de todos os esforços e discussões, o destino do São Pedro parece selado. As limitações técnicas, as disputas judiciais e a falta de ação preventiva deixaram-nos de mãos atadas diante da degradação do edifício.

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Frente a este desfecho, surge uma reflexão crucial sobre o papel da memória coletiva na construção de nossa identidade e na preservação de nossa história. É um lembrete doloroso, porém necessário, de que, sem um esforço consciente e contínuo para proteger e valorizar nossa herança cultural, corremos o risco de perder para sempre as raízes que nos conectam ao nosso passado e nos guiam em direção ao futuro.